segunda-feira, 29 de março de 2010

NÃO ENCONTRO PALAVRAS


Não encontro palavras…
Para dizer-te quanto te amo.
Percorri todos os dicionários
Todas as enciclopédias
E não encontrei palavras
Para definir quanto te quero
quanto te adoro
quanto és importante para mim.
Não encontro palavras que o definam
Tal a intensidade, a força…
que dentro de mim sustenta, e alimenta
este sentimento que sinto por ti.
Não encontro palavras…
para o definir.


Mário Margaride

AMO-TE



Sei de cor cada lugar teu
atado em mim, a cada lugar meu
tento entender o rumo que a vida nos faz tomar
tento esquecer a mágoa
guardar só o que é bom de guardar

Pensa em mim protege o que eu te dou
Eu penso em ti e dou-te o que de melhor eu sou
sem ter defesas que me façam falhar
nesse lugar mais dentro
onde só chega quem não tem medo de naufragar

Fica em mim que hoje o tempo dói
como se arrancassem tudo o que já foi
e até o que virá e até o que eu sonhei
diz-me que vais guardar e abraçar
tudo o que eu te dei

Mesmo que a vida mude os nossos sentidos
e o mundo nos leve pra longe de nós
e que um dia o tempo pareça perdido
e tudo se desfaça num gesto só

Eu vou guardar cada lugar teu
ancorado em cada lugar meu
e hoje apenas isso me faz acreditar
que eu vou chegar contigo
onde só chega quem não tem medo de naufragar


Mafalda Veiga

O APANHADOR DE DESPERDÍCIOS



Uso a palavra para compor meus silêncios.

Não gosto das palavras

fatigadas de informar.

Dou mais respeito

às que vivem de barriga no chão

tipo água, pedra, sapo.

Entendo bem o sotaque das águas.

Dou respeito às coisas desimportantes

e aos seres desimportantes.

Prezo insetos mais que aviões.

Prezo a velocidade

das tartarugas mais que a dos mísseis.

Tenho em mim esse atraso de nascença.

Eu fui aparelhado

para gostar de passarinhos.

Tenho abundância de ser feliz por isso.

Meu quintal é maior do que o mundo.

Sou um apanhador de desperdícios:

Amo os restos,

como as boas moscas.

Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.

Porque eu não sou da informática:eu sou da invencionática.

Só uso a palavra para compor meus silêncios.


Manoel de Barros

quinta-feira, 25 de março de 2010

PREFIRO SER LOUCO



Prefiro ser louco,

Prefiro ter sal,
Prefiro surtar,
A ter que ser normal

Prefiro ser passional,
Prefiro ser poético,
A ter um olhar tão convencional.

Prefiro ser intenso
Prefiro ser estranho
A ter que relegar meus melhores sonhos

Prefiro minhas angustias
Prefiro minha intuição
A ser colocado no molde da razão

Prefiro os traços bem delineados
Do que ser do clube dos alienados.


Alexandre Fiuza

quarta-feira, 24 de março de 2010

AUSÊNCIA


Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num pais sem nome
Ou numa terra nua

Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausencia é mais funda do que a tua.

Sophia de Mello Breyner Andresen



sábado, 20 de março de 2010

TODO O TEMPO É DE POESIA


Todo o tempo é de poesia

Desde a névoa da manhã
à névoa do outro dia.

Desde a quentura do ventre
à frigidez da agonia

Todo o tempo é de poesia

Entre bombas que deflagram.
Corolas que se desdobram.
Corpos que em sangue soçobram.
Vidas que a amar se consagram.

Sob a cúpula sombria
das mãos que pedem vingança.
Sob o arco da aliança
da celeste alegoria.

Todo o tempo é de poesia.

Desde a arrumação ao caos
à confusão da harmonia.


Antonio Gedeão

quarta-feira, 17 de março de 2010

CONTÁGIO


Feroz em nós uma paixão de novo
nos ameaça
nos faz vibrar, o sangue flui
sobe no rosto
de repente a gente fica
disposto a tudo
e tudo é pouco
não importa que essa loucura
não tenha alívio
a gente muda, respira de outro jeito
arfa no peito sempre uma pressa
sempre aquela vontade
sozinha fico metade
depressa me abraça, uma saudade
que dói, uma coisa que arrebenta
e não se agüenta mais.

A gente se entrega ao risco
arrisca a pele, perde o rumo
no prazer dessa desorientação
A gente quer explodir e não pode
quer se conter e não sabe
quer se livrar do jugo da paixão
mas não quer que ela acabe.


Bruna Lombardi

terça-feira, 16 de março de 2010

AMOSTRA SEM VALOR



Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível:
com ele se entretém
e se julga intangível.

Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
não pesa num total que tende para infinito.

Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
ignoram todo o homem, dissolvem-no, e, contudo,
nesta insignificância, gratuita e desvalida,
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.


Antonio Gedeão


SONETO DO AMOR TOTAL


Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te afim de um calmo amor prestante
E te amo além, presente da saudade
Amo-te enfim com grande liberdade
Dentro da eternidade a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia, no teu corpo, de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.


Vinícius de Moraes

sábado, 13 de março de 2010

14 de Março - Dia da Poesia



"O que dá valor à poesia não é a página que ela enfeita,
mas a paz que propicia quando enche de alegria o peito que dela aproveita."


quarta-feira, 10 de março de 2010

MAR SONORO



Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.

A tua beleza aumenta quando estamos sós

E tão fundo intimamente a tua voz

Segue o mais secreto bailar do meu sonho

Que momentos há em que eu suponho

Seres um milagre criado só para mim


Sophia de Mello Breyner Andresen

sábado, 6 de março de 2010

É PROIBIDO



É proibido.

É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas

Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,
Não transformar sonhos em realidade.

É proibido não demonstrar amor

Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.
É proibido deixar os amigos.
Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.

É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,

Fingir que elas não te importam,
Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.

É proibido não fazer as coisas por si mesmo,

Não crer em Deus e fazer seu destino,
Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.

É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,

Esquecer seus olhos, seu sorriso,
só porque seus caminhos se desencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.

É proibido não tentar compreender as pessoas,

Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,
Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.

É proibido não criar sua história,

Deixar de dar graças a Deus por sua vida,
Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.

É proibido não buscar a felicidade,

Não viver sua vida com uma atitude positiva
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual.


Pablo Neruda

UNS VERSOS



Sou sua noite, sou seu quarto
Se você quiser dormir
Eu me despeço
Eu em pedaços
Como um silêncio ao contrário
Enquanto espero
Escrevo uns versos
Depois rasgo
Sou seu fado, sou seu bardo
Se você quiser ouvir
O seu eunuco, o seu soprano
Um seu arauto
Eu sou o sol da sua noite em claro, um rádio
Eu sou pelo avesso sua pele
O seu casaco
Se você vai sair
O seu asfalto
Se você vai sair
Eu chovo
Sobre o seu cabelo
pelo seu itinerário
Sou eu o seu paradeiro
Em uns versos que eu escrevo
Depois rasgo


Adriana Calcanhoto

A MINHA GRAÇA

A minha graça, sou eu quem a crio
embora seja ela quem me educa,
vejo-a no espelho, na tela dos rios,
massageia o meu ego, me evita rugas

A minha graça não é passageira,
mora comigo, dorme a noite inteira,
fantasmas ameaçam, acordo gritando
ela me abraça e diz: foi tudo um sonho!

A minha graça, anda do meu lado,
sempre constante, me policiando,
ri da minha cara, faz estardalhaço
por quedas que levei e saí chorando

Essa minha graça que me determina,
esconde meus males, mostra meu humor,
me enleva a estima, diz que sou menina,
a olhar pros lados em busca de um novo amor...


Marcelo Dalla



terça-feira, 2 de março de 2010

SER POETA

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de ouro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!



Florbela Espanca

MILÁGRIMAS




Em caso de dor, ponha gelo

Mude o corte do cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema, dê um sorriso
Ainda que amarelo
Esqueça seu cotovelo
Se amargo for já ter sido
Troque já este vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério, deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada milágrimas sai um milagre
Em caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa
Coma somente a cereja
Jogue para cima, faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra apenas, viva apenas
Sendo só fissura, ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena, reze um terço
Caia fora do contexto, invente seu endereço
A cada milágrimas sai um milagre
Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas, três, dez, cem mil lágrimas, sinta o milagre
A cada milágrimas sai um milagre


Itamar Assumpção

AMO-TE


Amo-te quanto em largo, alto e profundo
Minh'alma alcança quando, transportada,
Sente, alongando os olhos deste mundo,
Os fins do Ser; a Graça entressonhada.

Amo-te em cada dia, hora e segundo:
À luz do sol, na noite sossegada.
E é tão pura a paixão de que me inundo
Quanto o pudor dos que não pedem nada.

Amo-te com o doer das velhas penas;
Com sorrisos, com lágrimas de prece,
E a fé da minha infância, ingênua e forte.

Amo-te até nas coisas mais pequenas.
Por toda a vida. E, assim Deus o quisesse,
Ainda mais te amarei depois da morte.


Elizabet Browning