domingo, 29 de julho de 2012

AMOR


Fosse paixão, e seria fácil:
bastavam meia duzia de figuras de linguagem
explosivas e inverídicas, cuja pirotecnia
e brilho impactantes, ofuscando o vazio
por trás da fugaz alegoria,
já seduziriam as duas metades
incomunicáveis de cada casal triste,
e por isso críveis no desvario
da aventura passional como saída.

Fosse apenas sexo, e palavras quentes,
bem sacadas pela carga de luxúria e lascívia
beirando o obsceno, ao criarem um clima
de lírico impudor já tornavam cúmplice o leitor,
devido ao carisma do erotismo,
que excita, nivela e arbitra
o mesmo destino
a puros e a libertinos.

E fosse só poesia, mais fácil ainda:
com um punhado de frases acentuadas por espaços,
e rimas alocadas com pontaria,
já certa música e algum equilíbrio de texto lá estariam;
depois, com a aliteração e as tônicas
realçando o ritmo, as metáforas teriam graça, frescor,
um toque de alegria,
- e, por fim, desarrumando tudo,
o poema ficaria difícil,
parecendo profundo.

Mas sendo Amor, o poeta se complica,
se aquieta por sincero
e medita
confuso, repleto,
sem armadilhas,
maravilhado
e sem palavras.


José Renato Marino

quinta-feira, 26 de julho de 2012

OLHA


Olha você tem todas as coisas
Que um dia eu sonhei prá mim
A cabeça cheia de problemas
Não me importo, eu gosto mesmo assim.

Tem os olhos cheios de esperança
De uma cor que mais ninguém possui
Me traz meu passado e as lembranças
Coisas que eu quis ser e não fui.

Olha você vive tão distante
Muito além do que eu posso ter
E eu que sempre fui tão inconstante
Te juro, meu amor, agora é prá valer.

Olha, vem comigo aonde eu for
Seja minha amante, meu amor
Vem seguir comigo o meu caminho
E viver a vida só de amor.


Roberto Carlos

sexta-feira, 20 de julho de 2012

O CAMINHO NÃO EXISTE


Escolher o caminho não é olhar os guias,
não é traçar os percursos, nem consultar os mapas.
Não é continuar trilhando as mesmas vias
tantas vezes percorridas,
antevendo cada etapa,
hora de chegada ou partida.
Saber o caminho pode ser
simplesmente não saber
onde fica o tal lugar,
onde é que vamos dar -
SE vamos dar em algum lugar...
Pode ser apenas seguir a viagem
sem nunca perder de vista
a paisagem que se mostra,
generosa, à beira da pista...
Não deixar passar o detalhe
que não se viu da outra vez,
ver com olhos novos,
até onde alcança a vista;
olhar o antigo como se fosse
ainda a primeira vez.
Não há mapas.
Nem estradas, nem percursos.
Não há que se gastar tempo,
nem os nossos parcos recursos
com receios e lamentos.
Não há que se perder
um mínimo de energia
querendo tocar miragens:
há que fazê-las reais.
Não há estrada, nem destino.
Nem nada.
Tudo que há é a viagem.
De nada adiantam guias alheios,
nem se levar por receios
que outros andaram criando.
A viagem de cada um de nós é única.
Não precisa mala,
só o coração na bagagem.
Basta a própria túnica
para lenço em alguma paragem,
que seque aqui e ali
a lágrima inesperada
ou que contenha o espanto
ante alguma paisagem
que nos esconda a estrada...
Só é preciso seguir.
Lembrar que não há destino.
Só é preciso insistir.
Sempre e novamente,
com espírito menino;
seguir estrada adiante,
olhando o terreno e o divino
com olhos de eterno amante;
perscrutar nossas entranhas,
cavernas e profundezas,
enxergar a própria imagem,
sem espanto ou estranheza,
e saber que o caminho não existe:
É a viagem.


Débora Cristina Denadai

sábado, 14 de julho de 2012

POEMA DO AMIGO


Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica…


Vinicius de Moraes

terça-feira, 10 de julho de 2012

PONTO SEM NÓ


Você não dá
ponto sem nó
ponto cruz
ponto cheio
ponto ajour
jura que não
vive sem nós
mas nunca diz
a que veio
mon amour.

Nosso enredo enrolado
todo emaranhado
tecido por linhas tortas
foi desfiado
a trama é toda sua
personagem principal
quanto a mim
resta o papel vilão
do ponto final.


Alice Ruiz

TORRE AZUL


É preciso construir uma torre
- Uma torre azul para os suicidas.
Têm qualquer coisa de anjo esses
suicidas voadores, qualquer coisa
de anjo que perdeu as asas.

É preciso construir-lhes um túnel
- Um túnel sem fim e sem saída
e onde um trem viajasse eternamente
como uma nave em alto mar perdida.?
Ruazinha em que eu penso às vezes
Como quem pensa numa outra vida...

É preciso construir uma torre...
É preciso construir um túnel...
É preciso morrer de puro, puro amor!


Mário Quintana

segunda-feira, 2 de julho de 2012

CEMITÉRIO DA ALMA


Hoje não tem lua cheia
não tem amor nem ternura
hoje é um dia nublado
um céu de estrelas nuas.

Hoje não tem sonhos bons
não tem fervor nem candura
hoje é mais um passo da morte
uma estrada para a loucura.

Hoje não tem salvação
pedidos, desejos, apelos
que não te escapem pelas mãos

E hoje não existe emoção.
Versos, prosas, és poeta
e é tudo que tens de bom.


Thiago Grijó Silva