sexta-feira, 29 de abril de 2011

ESTE QUARTO...



Este quarto de enfermo, tão deserto
de tudo, pois nem livros eu já leio
e a própria vida eu a deixei no meio
como um romance que ficasse aberto...

que me importa este quarto, em que desperto
como se despertasse em quarto alheio?
Eu olho é o céu! Imensamente perto,
o céu que me descansa como um seio.

Pois só o céu é que está perto, sim,
tão perto e tão amigo que parece
um grande olhar azul pousado em mim.

A morte deveria ser assim:
um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim...

Mário Quintana

quarta-feira, 27 de abril de 2011

FELICIDADE



Se eu pudesse congelar o tempo,

escolheria este momento

exatamente agora,

nesta pouca hora

de uma quarta-feira.


O gerânio novo

enfeitando a prateleira,

o riso da criança

brilhando lá fora.

O livro aberto

no lugar certo,

que simplesmente diz

"Eu não tenho nada,

mas rouxinóis gorgoleiam

versos na calçada"

É assim que se começa a ser feliz.



Flora Figueiredo

terça-feira, 26 de abril de 2011

O SEU SANTO NOME



Não facilite com a palavra amor.

Não a jogue no espaço, bolha de sabão.
Não se inebrie com o seu engalanado som.
Não a empregue sem razão acima de toda razão (e é raro).

Não brinque, não experimente, não cometa a loucura sem remissão

de espalhar aos quatro ventos do mundo essa palavra

que é toda sigilo e nudez, perfeição e exílio na Terra.

Não a pronuncie.



Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 25 de abril de 2011

AUTO-RETRATO



Lágrima

(que para tantos é dor)
para mim é chuva breve
horizonte
brisa leve
arco-íris
sol e cor

é palavra a ganhar rima
poema que me fascina
o verso que me seduz
meus olhos são como tela
vendo a vida da janela
pintura, sombra e luz

e cada lágrima que brota
sabendo que ninguém nota
qual rio desaguando ao léu
refaço-me passo a passo
descubro em suaves traços
que meu mundo é um pincel.


Alice Daniel

sexta-feira, 22 de abril de 2011

MENINA DE SAIA ENCARNADA



Menina bonita

De saia encarnada
Que passas na rua
Correndo apressada
Corre contente
Que a vida é ligeira

Menina bonita
De saia encarnada
Os teus pensamentos
E os teus caracóis
Parece que bailam
Contigo na lua,
E a tua cabeça,
ligeira doninha
Parece mais leve
Que uma andorinha

Corre menina
De saia encarnada
Que a vida p'ra ti
É sonho e mais nada.


Vivaldo Beldade

terça-feira, 19 de abril de 2011

ESCREVO PARA NÃO MORRER...


Para não morrer, para não explodir,

Para desabafar meus sentimentos,
Esta força que me avassala e oprime,
É por isso que escrevo!

E por que tenho vida - vou escrevendo;
Meu interior pede a tradução em letras e versos
Do que se agiganta em mim...

Escrevo, enfim, para renascer.
Pois o turbilhão que minh´alma encerra
Me lança a estratosfera...

Escrevendo chego ao infinito,
E como uma onda num oceano de areia,
Densa, vou num crescendo, rolando nas dunas...

Escrevo, pois preciso dizer o que aprendi!
Muitas coisas nos esperam além da estrada,
Da imensidão, indizíveis e invisíveis a olho nu,
A eternidade!

E escrevo, enfim, para que caibam dentro de mim,
Todas as angústias e dores que carrego,
E antes que eu desabe, como um grão de areia
Que se joga ao vento,
Escrevo para não morrer....


Delasnieve Daspet

sábado, 16 de abril de 2011

SÚPLICA PAGÃ




Sopra, vento,
e carrega além daqui
o que me vai no pensamento;

Corre, água,
e deságua a mágoa no além mar
dessa ausência, demência que me afoga;

Passa, nuvem,
e desliza meu desejo
de querer quem eu não vejo;

Volta, tempo,
e devolve pra os meus braços
os abraços, laços, lentos;

Olha, Deus,
esta tua criatura
com pecados, nada pura
que suspira, chora, inspira.

Concede-me um milagre
e deixai ser, esse amor
que desde sempre já é.
Fazei vinho, do vinagre
e batizai a minha fé.


Célia Sena

quarta-feira, 13 de abril de 2011

POESIA!



Abra essa garrafa,

É vinho d’outra safra,
É poesia curtida,
Mas pode ser sorvida.

É perfume de alfazema,
Composto em um poema,
Veste a alma de alegria,
Desaperta em si a magia.

Todo poema é assim,
Um mar azul sem fim,
Água que beija a areia,
Ao canto de uma sereia.

E quando fala de amor,
O coração vira flor,
A alma se veste de lua,
E a paz se torna nua.

Na verdade me inebria,
Quando me toma a poesia,
Me eleva ao paraíso,
E de mais nada eu preciso.

Santaroza

segunda-feira, 11 de abril de 2011

FAZER UM CÉU



Fazer um céu, com pouco a gente faz
basta uma estrela
uma estrela e nada mais.

Pra ter nas mãos o mundo
basta uma ilusão
um grão de areia
é o mundo em nossa mão.

Sonhar é dar à vida nova cor
dar gosto bom às lagrimas de dor
o sol pode apagar, o mar perder a voz
mas nunca morre um sonho bom dentro de nós.

Mário Lago

sexta-feira, 8 de abril de 2011

SOU



Sou o que a vida me faz a cada dia

um tanto de tristeza, outro de alegria
uma lágrima que cai doida
um sorriso que vence ao fim da lida

Sou mulher, sou menina, pouco sei
ora dona de mim, de tudo e de ninguém
segura, insegura, tantas vezes relutei
tentando me encontrar também

Sou o que sou a cada hora
não busco fatos nem razões
sou apenas um ser experimentando
todas as suas emoções

Não me conheço, podem dizer
mas só eu sou o que eu posso ser
e sou tudo que posso em cada tempo
tentando ser sempre eu, a todo momento

Célia Jardim